UM CASO MUITO COMUM

10/08/2014 14:59

A mãe da paciente me procurou, pois a filha apresentava apatia e abandono dos estudos, da escola e dos amigos.

Numa certa noite, mãe e avó buscaram ajuda no Colégio onde a paciente estudava através da Coordenadora Pedagógica. A coordenadora chamou-me em sua sala e, diante da mãe e avó, solicitou minha intervenção.

Durante a conversa, foi colocada a situação da família. A avó era separada, a mãe também era separada e ambas moravam com a paciente, mais um irmão um ano mais novo.

A mãe marcou, em meu consultório, uma primeira sessão, posteriormente cancelada devido à paciente se recusar a comparecer. Pedi à mãe que não forçasse sua ida, pois isso deveria ser espontâneo para o sucesso do tratamento.

Duas semanas depois a paciente compareceu à primeira sessão.

A sua ansiedade e depressão estavam estampadas em seu rosto.

Em meio a choros e risos ela começou a se soltar como se tivesse essa necessidade há muito tempo.

Contou que, no ano anterior, começara a namorar e desde então sua vida, que estava controlada, passou a ser carregada de pressões e ansiedades.

O namoro reviveu seu passado através de momentos que ela, a toda hora, comparava com aqueles que a marcaram na infância. Começou a achar que tudo o que fazia agredia as pessoas que amava, que eram basicamente a mãe e a avó. Esses momentos, vindos na lembrança, deixavam-na apática ou ansiosa.

No colégio ou em qualquer outra atividade não conseguia concentração. Qualquer barulho por mais leve que fosse era suficiente para dispersá-la.

A sua infância foi sempre muito tumultuada. Pai e mãe tinham brigas constantes. O casamento deles foi feito de altos e baixos, havendo sete separações e reconciliações até a separação definitiva. Isso fazia com que a paciente vivesse constantemente em trânsito entre sua casa e a de sua avó. Segundo ela, sempre que estava na casa de sua avó tinha o pensamento em sua casa, imaginando o que poderia estar acontecendo. Quando estava em sua casa, queria voltar para a casa de sua avó, pois era lá que se sentia bem e amada. Estava claro que era tremendamente apegada à avó, mas também à mãe. Aliás, a família sempre foi para ela algo muito importante. Cada vez que se ausentava de casa sentia-se como que perdendo a família. A saída definitiva do pai gerou um vazio muito grande visto que o pai deixou de visitá-la exceto para trazer a pensão.

Após a separação, o pai mudou totalmente de vida. Segundo ela, era por isso que ele não podia mais acompanhá-la. A mãe, sentindo medo, se contradizia em relação ao pai. Pedia para que ela o amasse, mas em seguida contava momentos que mostravam o outro lado do pai. Assim, ela não sabia exatamente qual era o verdadeiro caráter do pai e se devia amá-lo ou odiá-lo.

O seu único namoro também foi cheio de idas e vindas o que fazia com que ela revivesse, a cada briga ou reconciliação, a situação já vivida entre pai e mãe, quando ela tinha 9 anos. Por pressão do namorado, que a impediu de ir ao noivado da prima, sentiu uma enorme culpa. Era como se estivesse abandonando a família e tudo o que amava. Isso causou nela um ódio muito grande do namorado, mas manteve o namoro por não querer magoá-lo. 

Já ouviu histórias como essa? Continuaremos na próxima sessão.