DE VOLTA AO DIVÃ

19/05/2015 13:36

DE VOLTA AO DIVÃ

A mãe da paciente me procurou,pois a filha apresentava apatia e abandono dos estudos, da escola e dos amigos. No colégio ou em qualquer outra atividade não conseguia concentração.

Após a separação, o pai mudou totalmente de vida.

A filha parou de sair de casa, inclusive ir à aula, para não deixar a família. A família, sempre reafirmava, era tudo para ela.

Após as primeiras análises, concluí que a paciente tinha uma situação traumática ocorrida durante o processo de separação dos pais.

A escola, ponto principal de sociabilização, foi a primeira coisa a ser excluída. Abandonou os estudos não fazendo nem mesmo as provas de final de ano.

O ponto crítico, no entanto, era a falta do pai. A expulsão do pai de sua vida estava fazendo com que ela buscasse a figura paterna no namorado. De acordo com sua explanação, o namorado queria tê-la como namorada (mulher), enquanto ela o queria como uma força segura e terna. Disse inclusive que não suportava os carinhos, mas aceitava por submissão. Depois se sentia culpada e esse complexo a fazia sofrer. Era como se estivesse cedendo ao pai e isso a colocava em frustração e com um enorme complexo de culpa que a fazia sofrer como se estivesse sendo violentada por uma marca no pescoço, como ela colocou.

O caminho estava em alterar, principalmente, os valores da infância, quando da separação dos pais.

Naquele momento, a importância da relação era imprescindível e a separação não encontrava, na criança, uma lógica inteligível. Essa marca deixada no inconsciente fez com que sair de casa fosse um ato violento e de perda da família (o que já ocorrera, voltava a ocorrer a cada vez que se afastava de casa).

Após a primeira sessão, segundo a descrição de seus atos pela sua mãe, era possível notar que a paciente já entrara em processo reflexivo. Estava começando a resgatar os valores da infância e transportando-os para o presente. Era o primeiro passo para a mudança desses valores. Notei quão importante era que os valores fossem mesmo alterados sob um conceito mais atual e dentro de um raciocínio de 18 anos e não de 9.

Solicitar ir ao shopping, sozinha, era uma tomada de decisão vitoriosa dentro de seus conceitos e valores. Era preciso que a mãe a liberasse, deixando que ela tomasse tais decisões.

Na sessão seguinte a paciente apresentou-se com significativa melhora de comportamento. No entanto, não soube começar qualquer assunto sem que eu desse o início. Resolvi começar de onde havíamos parado na sessão anterior. Perguntei a respeito de sua infância, tentando buscar recordações, que tudo indicava, era onde estava a causa de sua depressão e ansiedade.

A paciente disse ter tido uma infância agradável e feliz, sempre ao lado da avó. Todas as vezes que a mãe ia buscá-la, para levá-la em casa, ela chorava muito porque não queria ir com a mãe.

Outro detalhe que pude ressaltar era que preferia conversar com pessoas mais velhas. Novamente a figura do pai estava presente.

Durante toda a sua infância, lembrou-se de ter tido apenas uma amiga, ao contrário do irmão que sempre foi bem relacionado.

Pouco se lembrava de experiências interessantes ao lado da mãe. As melhores lembranças foram ao lado da avó. Exceto na primeira sessão, jamais falou do pai.

Sem nenhum motivo, mudou de assunto como se quisesse evitar, naquele momento, falar sobre a mãe.

Perguntei-lhe a respeito do namoro e me disse que havia terminado definitivamente.

Nesse momento, falamos uma frase (duas palavras) ao mesmo tempo. Imediatamente, ela buscou na memória uma brincadeira de criança onde contamos as letras e depois associamos a palavras relacionadas a amor e afeição. Agora, via em minha frente uma criança de 9 anos, entusiasmada pela alegria de estar sendo correspondida em sua brincadeira. Isso durou aproximadamente 8 minutos. 

Fim da 3ª sessão.