A ADAPTAÇÃO AO NOVO AMBIENTE

30/12/2015 16:25

 

O que mantém um trauma por muito tempo é o fato do paciente não alterar os valores adquiridos durante a infância ou na época em que ocorreu. É preciso ficar claro que um automóvel, por exemplo, durante a infância não tem o mesmo valor que tem durante a adolescência nem tampouco durante a fase adulta. O que ocorre é que, com o surgimento do trauma, estabelece-se um bloqueio em que a análise deixa de existir. Passa a ser doloroso ao consciente rememorar a marca traumática. Assim, o inconsciente cria uma barreira impedindo que os valores sejam reavaliados conscientemente. É preciso penetrar novamente nesse ponto da história da vida do paciente para que, com novos conhecimentos lógicos, adquiridos na vida atual, os códigos de valores sejam recodificados, deixando claro a ele mesmo, e por ele mesmo, que aquela dor já não tem mais sentido, e que, de acordo com os valores atuais, não é motivo para tanto. Quando o paciente finalmente se conscientizar dessa mudança, fatalmente o trauma estará desativado e o paciente terá como lembrança apenas um fato histórico dentro de seu banco de dados, com o discernimento da lógica atual, bem mais estruturada.

Os resultados obtidos, no primeiro teste, como era de se esperar, não foram positivos. Contudo, a própria paciente, animada que estava para realizar os testes, solicitou que continuássemos na próxima sessão.

A sessão seguinte ocorreu oito dias depois por solicitação da paciente. Ela alterou o dia da semana por insistência da mãe. No que pude perceber, a mãe continuava exercendo forte influência sobre ela.

Pelas informações enviadas à minha secretária na clínica, a paciente havia conseguido emprego no Shopping Center, em uma loja de roupas, exatamente como ela dissera na sessão anterior. Assim, eu aguardava novidades e uma mudança visível nessa sessão.

Como o esperado, ela começou a sessão falando da novidade. Comentou sobre as obrigações de vestimentas e postura durante as horas de trabalho. A adaptação ao novo ambiente foi difícil e, após o terceiro dia de trabalho, pediu a conta.

Enquanto narrava sua história, parecia buscar as imagens daqueles três dias. Comentou a sua angústia enquanto trabalhava na loja. Via pais com crianças passando e se sentia presa. Parecia que essas imagens a perturbavam.

Nesse momento, pediu que eu desligasse o circulador de ar. Apesar do calor, o barulho a incomodava. Mostrava uma sensibilidade incomum.

O grande progresso foi haver conquistado esse emprego por si só. Sempre carregara o estigma de “lerdinha”, dito principalmente pela mãe. O fato de ir de ônibus a fez sentir-se livre. Achou importante tomar contato com o cotidiano.

Mais uma vez, disse que haveria de procurar algo novo. Como secretária talvez.

De sua vida na última semana, comentou que tinha dormido bem, tido sonhos interessantes e ido ao clube, coisa que há muito não fazia.

Na véspera da sessão seguinte sua mãe me ligou. Interessante as suas colocações. Era fácil analisar e entender a dependência da paciente. Pelas coisas que sua mãe me colocava, ficavam claros os motivos que levaram a paciente a esse estado tão depressivo.